Hotel praia Brava e o marketing insistente

Dieverson Colombo
5 min readJun 9, 2021

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A bela praia Brava, em Florianópolis. Natureza exuberante e lições de como não fazer marketing
Foto: Arquivo Pessoal

Sábado, início de dezembro. Estava em Florianópolis e fui com a minha namorada conhecer uma das praias: a Praia Brava. Tinha tudo para ser um passeio interessante e gostoso para aproveitar o dia um pouco nublado. E em partes foi. Mas o marketing mais uma vez provou que, se feito de forma errada, tem um efeito muito reverso.

Paramos no mirante, antes de descer para a praia. Olhamos aquela linda vista, tiramos algumas fotos e conversamos um pouco. Só nós e mais um homem no mirante naquele momento aproveitando. Esse homem estava sentado, no canto direito. Parecia triste e solitário em um primeiro momento. Ou poderia só estar esperando alguém. Eis que, na hora de sairmos, ele nos chama perguntando se já conhecemos a Praia Brava.

Quando ele nos chamou, pensei que poderia pedir algum tipo de ajuda. Mas quando terminou a frase pedindo se conhecíamos a praia, já entendi que ele iria oferecer algo. E ofereceu.

Falou do hotel, o único da praia, que está em reformas e nos convidou para conhecer a estrutura. Conhecer a estrutura de um hotel em um sábado programado para descansar a cabeça já é mega estranho, mas ok. Falou que nos daria um cupom que, mostrando lá no hotel e conhecendo a estrutura, nos daria a possibilidade de ficar cinco dias por apenas R$60 a diária.

Sim, isso chamou a atenção. Pagar R$300 reais de diárias para ficar quase uma semana na praia? Em Florianópolis? No mínimo interessante. Pegamos o papel, falamos que iríamos conhecer a praia e depois quem sabe passaríamos por lá.

Descemos o morro, chegamos na praia, gostamos muito e estacionamos o carro. Trocamos algumas palavras sobre o tal desconto, mas ainda não havia uma decisão. A tendência era não ir. Afinal, perder uma parte considerável do sábado para conhecer uma estrutura de concreto não estava nos nossos planos.

Ao sair do carro, fomos perto da beira-mar e vimos um daqueles calçadões, onde é possível caminhar vendo o mar sem estar na areia. Pegamos esse trajeto para conhecer um pouco mais. Eis que surge um homem da praia, vestindo um uniforme e conversando com um casal. Até aí tudo bem. Então ele deixa o casal caminhando e falando sozinho do nada e vem na nossa direção.

Pergunta se já conhecemos a Praia Brava e diz que não vai atrapalhar. Sempre que alguém diz isso, acontece o contrário. Começa a apresentar o famoso hotel. Até que interrompemos dizendo que o colega dele já nos deu o cupom lá em cima, no mirante. Ele para e explica como chegar no hotel.

Ok. Seguimos adiante. Naquele momento, as chances de visitar a estrutura tão incrível e famosa, a qual pessoas estão por todos os cantos da praia, já era muito pequena. O valor oferecido era realmente muito atrativo. Mas depois dessas abordagens, a real vontade era de não ir de forma alguma. Conversamos no caminho e em consenso decidimos que era melhor não visitar nada e ir embora.

Importante ressaltar que a praia é linda, cercada de morros, com prédios na beira-mar muito charmosos. A vontade de já ficar por lá era real e grande. Para evitar encontrar o vendedor insistente, pensamos em voltar por algum caminho alternativo para pegar o carro. Encontramos uma escada, subimos e a saída era na rua. Excelente escolha!

Conversamos sobre a praia, sobre a tal da proposta, sobre outros assuntos. Um sábado na praia normal. A rua que saímos passava na frente do inesquecível hotel. Passamos rapidamente e duas pessoas estavam conversando na porta. Tudo certo até então. Uma das pessoas era um homem com uma bicicleta elétrica. Aquela pessoa que você olha e já pensa ser alguém que abandonou a vida na cidade grande para relaxar no interior e aproveitar o contato com a natureza. Ótima escolha, claro.

Continuamos a caminhada e esse homem da bicicleta sai com ela pela rua. Olho para o lado para ver a bicicleta elétrica, porque acho interessante esse meio de transporte. Tudo tranquilo. O carro estava cada vez mais próximo e o dia iria seguir da melhor forma.

Até que esse homem da bicicleta passa por nós e pergunta: vocês já foram conhecer o hotel?
Na hora eu só consegui pensar onde eu estava. Porque era uma terra dominada pelo tráfico do marketing e não estávamos conseguindo sair. Será que a única forma de se libertar era conhecendo o hotel tão incrível que a praia inteira se mobiliza para ele?

Respondemos que ainda não, que estávamos indo buscar o carro e que depois talvez faríamos a visita. Ele respondeu que é bem rápido, não mais do que 20 minutos.

Viramos a esquina, chegamos na rua onde estava o carro e o pesadelo estava finalmente acabando. Entrar no carro, fechar a porta e ir almoçar era o objetivo. É claro que o mesmo vendedor que nos abordou na chegada estava por lá, indo em direção ao carro que estacionou do lado do nosso.

Duas pessoas também chegaram um pouco para trás e foram abordadas por ele. Em uma cena típica de James Bond amador, fomos pelo lado, por cima da grama tentando nos esconder, entramos no carro, fechamos a porta e saímos rapidamente. A fuga do marketing estava subindo de nível.

A praia estava dominada por pessoas oferecendo o hotel, de forma que lembra muito séries de TV como Narcos, onde uma cidade ou bairro era dominada por um traficante. Onde só seria possível passar, ir e voltar, com autorização. O possível marketing inicial se transformava em um domínio desenfreado em busca de clientes para um hotel.

Nesse momento, é claro que não é mais possível imaginar que essa opção de hospedagem seja de qualidade. Não tem nada que mostre que isso possa ser possível.

E também é claro que não temos agora nenhum interesse em visitar esse hotel, independente do preço. Dá até um certo medo de voltar a visitar a praia e encontrar essas pessoas de novo. Em um primeiro momento o hotel poderia parecer interessante, mas se tornou o único lugar da praia que não queremos ir no futuro.

E assim como muitas estratégias populares no marketing, baseadas na insistência, no cansaço mental das pessoas e na oferta de um preço irresistível por trás disso, essa também se provou ser uma ideia horrível.

Você que leu até aqui, que trabalha com marketing ou pensa em contratar uma empresa para isso, pense no que vai fazer, na abordagem, em possíveis estratégias. A insistência de forma a quase implorar por clientes vai sempre, sempre gerar efeito contrário. Um claro exemplo nesse texto de como o marketing insistente não ajuda em nada.

Ao passar pelo hotel, não vimos nenhuma movimentação. Ou seja, as pessoas não estavam indo fazer a visita em busca do desconto.

Precisamos urgentemente falar sobre os modos de fazer marketing, a forma que essa importante e indispensável ferramenta é utilizada por empresas. Porque cada vez mais vemos o quanto o marketing é utilizado de forma tóxica.

Ofereça um serviço de qualidade, informe seu possível cliente sobre os benefícios e você terá resultados. Implorando por cliente, pedindo por favor, nunca será o melhor caminho. O efeito será sempre oposto.

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Escritor e jornalista. Autor do livro Reféns do Propósito. Escrevo sobre o mundo e o que sinto que preciso escrever.

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