Coronavírus: os números só pioram. Mas quem se importa?

Dieverson Colombo
4 min readAug 17, 2020

--

Crédito: Divulgação / Pixabay

Eu não dou um abraço nos meus pais desde o dia três de março. Era aniversário da minha mãe e fomos comer pizza. Depois disso os vi mais duas vezes, mas de longe. Eles dentro do carro, eu na calçada.

Mais de cinco meses que eu não vou até o apartamento deles, nem que eles vêm até o meu apartamento. E o motivo não é uma má relação. Eu sinto saudade deles. Eu amo eles. E por isso mesmo não estamos nos vendo.

Mas na maior parte dos dias, me sinto sozinho e até idiota. Não sozinho por conta da pandemia e sim porque pareço ser a única pessoa que ainda está tentando seguir o isolamento social, esperando uma vacina sair e a situação ficar um pouco melhor.

Estamos passando por uma pandemia. Talvez seja o único momento mais difícil em que todos os países estão envolvidos que vamos enfrentar em toda a nossa vida. Mas ninguém está nem aí para isso. O discurso de ficar em casa, de que nós que temos condições de fazer esse isolamento devemos seguir, já caiu por terra. E eu não consigo entender.

Acho que ninguém mais sabe disso. Ao entrar nas redes sociais, é possível comprovar que o coronavírus já passou na maior parte das cidades. Talvez eu seja um azarado mesmo, por estar em uma das únicas regiões do Brasil onde a pandemia não acabou. Onde o número de infectados e mortos cresce diariamente.

Talvez eu me mude. Aguardo sugestões de locais no Brasil onde a pandemia já acabou. Tenho certeza que são cidades abençoadas por Deus ou qualquer outro ser divino.

Basta abrir o Instagram, olhar alguns stories e a constatação está feita. Todo mundo está cagando para o que acontece. Pessoas recebendo visitas em casa, almoços de família, jantares com os amigos e visitas a familiares. Crianças no colo de outras pessoas, fazendo idosos confraternizações nessas famílias.

E para tornar tudo ainda mais divertido: NINGUÉM usando máscara.

É possível que a ciência já tenha explicado e eu perdi essa parte. Mas talvez um grande cientista descobriu que o coronavírus não é transmitido por família e pessoas próximas. Com essas tá tudo certo e não tem problema conviver. O risco de contágio é com desconhecidos.

Eu entendo e, sinceramente, não sei o que dizer em relação a quem precisa trabalhar na rua e não tem outra opção. Entregadores de comida por aplicativo, motoristas de ônibus, donos de pequenos negócios. Pessoas que, se ficarem em casa um único dia, isso vai fazer diferença no orçamento.

Essa é uma situação muito difícil de resolver e ajudar essas pessoas. A melhor forma de ajudar seria evitar aglomerações e ficar em casa. Mas isso parece impossível. Uma grande batalha que não parece ter mais como lutar.

Nesse momento que o mundo inteiro está encontrando formas de enfrentar essa situação, será que se o lazer com outras pessoas fosse deixado de lado, pelo menos por um tempo, seria tão impossível assim?

Será que as pessoas com totais condições de fazer o isolamento não conseguem ficar dois, três meses sem visitar um amigo, sem fazer uma confraternização em casa? Que dificuldade imensa é essa?

E o que dizer de pessoas que levantam a bandeira do fique em casa, que já trabalhavam em casa antes da pandemia, que têm condição de não receber visitas, não fazer churrascos, não ir visitar a família por um tempo. O que dizer de pessoas que trabalham com sua imagem, que influenciam pessoas com seus conteúdos e que não são capazes de apenas ficar em casa?

Porque o maior sacrifício é justamente ficar em casa. E só. O que mais vemos no dia a dia são pessoas reclamando que gostariam de ficar em casa um tempo, que estão saindo muito, a vida está corrida. Agora que isso se torna a melhor forma de não piorar as coisas, não parece ser possível.

Ao abrir redes sociais é isso que mais tenho visto. A pandemia já acabou para quem não enfrenta dificuldades na vida. A pandemia acabou para quem não consegue segurar a tentação de ficar três, quatro meses sem socializar. Todo e qualquer pensamento de ajudar o próximo, de torcer para que as coisas melhorem já foi embora. Usar máscaras não é mais uma necessidade.

O que importa é que o encontro familiar, que em alguns casos pode nunca ter sido muito prazeroso, aconteça. Comer em casa sozinho ou com sua família mais próxima é o fim do mundo. Impossível aguentar. Uma dor profunda que jamais será esquecida. Ninguém merece ficar um tempo sem receber visitas.

As pessoas estão morrendo, estão ficando doentes. Mas você precisa ir até a casa do seu familiar, pegar um bebê no colo, abraçar todo mundo, rir alto e beber muito. Sem máscara, claro.

Eu tenho vontade de não seguir mais pessoas que eu sempre gostei do conteúdo, mas que ignoram tudo que está acontecendo. Existe a discussão se devemos separar a parte profissional das atitudes, mas não sei se consigo.

Talvez eu deixe de acompanhar essas pessoas por um tempo. Estou pensando.

--

--

Dieverson Colombo
Dieverson Colombo

Written by Dieverson Colombo

0 Followers

Escritor e jornalista. Autor do livro Reféns do Propósito. Escrevo sobre o mundo e o que sinto que preciso escrever.

No responses yet